sábado, 8 de janeiro de 2011

Bem te dizia ali ao fundo K. que não era sequer preciso que saísses de casa.
O tudo todo que te arrasta não carece de milhas acumuladas para voar mais barato, nem de aproveitar a novidade de ser gente para conhecer a enorme variedade de estações de comboio da europa. O mundo inteiro aguarda chamada para se dizer presente a partir da tua sala.

A qualquer lado que chegue não sinto enfado, mas sim o fado. O meu fado enfiado dentro. De certo, certo certeiro, por certo, a esperança do ser deserto, de um talvez, porém, uma vida inteira de por aí além, do mais, conforme, consorte, com alguma sorte, com alguma, pode ser que acertes. A única certeza é a possibilidade do aborrecimento.
E o que rima com consolo nem sempre se faz alento. Não será à toa o tormento.


Não, não é preciso que saias. Mas melhor é que as uses.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

todos estes mares sempre o mesmo
sobram-nos nos olhos
e escoam-se pelos ouvidos


em parte alguma naufrágio rima com cotovia

há que estar atento
muito atento
para que não te dês ao ridículo por nadares
remares ainda o corpo estando já em terra seca



mantém os pulmões alerta





há principalmente que nunca confundir a água com a sede

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

chega de navios


o mar já não me mete medo


tenho é saudades de esfolar os joelhos


o mapa mundo não é metáfora do eu ser
o eu ser é que é metáfora do mapa mundo

e a não ser que desejes viver entre os peixes
(bem mais fácil criar guelras do que asas)
mais vale deixares-te por terra e teres uma janela para o mar

chegam-te os olhos para te lembrar no mar
que o caminho está todo nos pés com que andas
e que o mar está todo dentro da cabeça


toda esta fé num cais serviu um fim
o seu fim
era pre-cisa
foi necessária
acima de tudo
o importante
foi sempre

poupar os tornozelos

e rezar por uma terra onde coubesse a tua dança



o medo do afogamento é bem mais lírico do que o seu correspondente terreno

se fosse para morrer na praia, que fosse na água e não enterrada na areia


e eu sempre me safei bem a nadar
a aposta lírica era uma aposta sólida


mas chega, pois
de navios
de velas e cabos e tormentas

chega de mar




é sempre o mesmo céu sobre as nossas cabeças

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

le mot

le quai


le repos


palavra pousada
pousada palavra

na palavra
a ana cai
na palavra

a ana resta

a ana manca

falta a ana à palavra ou a palavra à ana

nem sequer falemos de faltar a carne à sala


o que resta do nosso fígado apanha o sol de março na varanda, mesmo sendo janeiro, mesmo quando é outubro

enrolo-me no horizonte
e continuo,


se não falta cais falta navio

e se as velas sobram o vento não leva



é mera brisa o sopro que te atropela


mas não te apoquentes
não muito pelo menos

há que rezar pelo tornado que sendo pressa e desalento
te obriga a parar o tempo e a chafurdar no espaço


certas geometrias não carecem de compasso

farei sempre a apologia do estilhaço
mas ai dos meus nervos quando alguém deixa cair o copo
ou a palavra

só o texto pode ser desgovernado
cair ao chão
partir-se
ser arremessado contra a cabeça bonita de uma donzela
espetado no baço de um futuro moribundo
ou atirado como ovos podres no carnaval


a palavra é sempre anárquica,
nunca cai, nunca se desgoverna

tem nela o cais, a queda e o navio


tu, tu é que cais na palavra

cais em ti dentro da palavra


e em vez de te deixares vir calmamente à superfície desse mar abismo
desatas a esbracejar o texto onde te irás afogar

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Enquanto se vive não se conta.


Nem se poema.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

aqui não se querem companheiros

lutamos apenas pelos cúmplices


reciproca-se a idade como se de um sentimento se tratasse
como se fosse ela que pelo instinto falasse

ora um gracejo
ora uma falácia

nunca tentes que um bocejo rime com a tua audácia

meras eras
quimeras, quiseras
é por turvo encosto que se te abaula a face
mas nunca é pelo punho que o amor nos nasce

quem deras
esperas, kunderas
o meu espaço há-de rimar sempre com esferas
com as feras, pois, e com o cansaço

há um laço entre o estar e o estar como o aço

a prata o ouro o estilhaço

queira eu
quem dera
quem me deras
a quem deras
a quem eras

por quem te esmeras
e com quem faço

isso das esperas e dos fracassos e do mais do que estar aço ser ferro


respira agora a minha vida dentro da tua demora
será sempre edipiana a cumplicidade que contar a história

e a mediana vai ser sempre transitória


por isso pois então porque não por que não

diz-me onde moras


dir-te-ei quem fui



onde estás? onde és? onde me és?

onde te dói?





por quem te esperas?


diz-me quem queres ser
e eu trago-te a morar comigo

sei ser paráfrase e sei ser abrigo

já deixei para trás o crime e o castigo


a janela e o postigo





sê-me varanda

que eu te seja varanda


sejamos varanda


sem muro, sem gradeamento





e pintemos a nossa vista







prometo todas as noites rezar para que não nos estatelemos em chão i-mundo

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

A dança do mundo é breve.


Tratemos portanto de cuidar bem os tornozelos.