segunda-feira, 23 de agosto de 2010

falha-me a vida à vida


já a morte nunca se lhe falha



tudo o resto são cartas e o ser que as baralha

a entidade


o senhor Desidério

a cargo dos encargos dos desejos e dos folhos

do que falta aos olhos



os dados meramente dobram
ou simplesmente afundam



as apostas colhem

escolhem

recolhem

e humanizam


tiram o erro das cartas e devolvem a falha ao homem




podem sempre faltar pintas negras numa das suas alvas faces

mas a mão foi sempre a tua





a partir de certa altura o casino vida é uma mera questão de fichas



dados infantes
coroas adultas

podes seguir a golpe de mojito ou de cicuta

a escolha é tua


entre a praia e a reduta redundância uma blasfémia democrática e muda a espanejar

a espoeirar

a varrer

a varrer arre pois a varrer


os fétidos vapores de uma ágora corrupta


de uma guerra
de uma puta

dessa grandessíssima filha de puta


e ai de nós falarmos mulheres de outras mulheres


ai o feminismo

ai o socialismo


ai o culturalismo


a política do égua lismo



nem machos nem sanguessugas


prefiro corujas trafulhas


olham
vêem
escutam

(e se pensarmos que entre o pescoço e os olhos destas soturnas senhoras vão cinco centímetros no espaço dois e um meio para cima dois e um meio para baixo e que a meio caminho entre as duas suas mais limítrofes iluminadas paralelas vão cinco paridos de um meio e que nesse novo meio a visão roda sinistra e destra e se nunca nunca a dita tudo vê ao mesmo tempo mas tudo percorre percorre tudo e aquilo que não vê ainda ainda pressente e o que deixa de ver sempre lembra e o que vai ver já viu ainda que em intermitência como um farol em penitência como um moinho sem vento e da mesma maneira que a eira traz sempre o abismo à beira entro mergulho dentro do poema lanço-me da ribanceira e morro ao largo do um aéreo fonema porque o sistema só pode ser visto entre o meio abaixo de uns olhos que sentem e o meio acima de um coração que cliché a cliché a cliché raios partam a rima ainda vê)

vivem hoje dentro desta minha espécie de reserva emocional bandos e bandos de corujas
umas quantas diásporas de andorinhas e umas matilhas de rouxinóis
a todos dirijo o vento

a ti as notas do sopro


mas só às corujas as sigo


serenas

sábias

complacentes



por elas passaram já todas as mágoas

ouviram já ranger todos os dentes


para o mundo

para este mundo


já não precisam de lentes



todos os filtros lhes couberam



entre os olhos e o coração já se fez o meio caminho



resta-nos louvar os mortos

agradecer os vivos



e tomar-lhes


aos lobos



esses olhos meus olhos atentos

emprestados pelas corujas

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